A política de drogas nunca esteve entre os temas prioritários do debate eleitoral. Não desperta o mesmo interesse de assuntos como saúde, educação e segurança, mas se relaciona com todos eles. Causa divergências internas em partidos de esquerda, de centro e de direita. São raros os candidatos preparados para responder sobre o tema com a devida complexidade.
Se a maconha ainda é um tema tabu nas eleições de 2018, a situação era pior nos anos 1990, quando nossa democracia ainda engatinhava.
Nesta época, a erva era quase sempre associada à degradação da juventude e da família. Quem ousasse sugerir o uso medicinal da cannabis tinha uma boa chance de ser ridicularizado. Muita coisa mudou, mas o preconceito e a ignorância continuam presentes nesta pauta.
Nesta conjuntura de monitoramento constante de Fake News nos discursos e propostas, os candidatos devem adotam um pouco mais de cautela ao falar de maconha.
Vai ser desqualificado quem disser que a proibição deve ser mantida pois a erva é “porta de entrada para outras drogas” ou que a famosa planta “queima os neurônios”. São mitos desqualificados pela ciência, mas que foram muito utilizados em campanhas anteriores, quando as informações para confrontar estas falácias eram raras.
Com o avanço da legalização em países como Uruguai, Canadá e Estados Unidos também ficou complicado utilizar outro velho argumento dos defensores da proibição: “A legalização da maconha nunca foi testada”, costumavam dizer.
Agora, com os primeiros indicadores dos países que retiraram a maconha da ilegalidade divulgados, ficou claro que não ocorreu explosão de consumo e os usuários não transformaram as ruas em um cenário de filme com zumbis.
Na campanha presidencial deste ano, apenas três dos treze candidatos defendem a legalização da maconha: Guilherme Boulos (PSOL), Henrique Meirelles (MDB) e Vera Lúcia (PSTU). Mariana Silva (Rede) marca uma posição pessoal contrária à proposta, mas defende um plebiscito popular para decidir sobre a questão.
Boulos costuma construir a defesa da legalização citando o fracasso da guerra às drogas e a necessidade de superação do modelo repressivo. Quando questionado sobre o tema, o candidato do PSOL também aponta para a necessidade de realizar este debate sem ótica moralizante e preconceituosa.
“Essa política serve unicamente para a manutenção da exclusão social, ao criminalizar a pobreza e superlotar presídios com gente pega por causa de 36 gramas de maconha e uma pedra de crack”, declarou Boulos.
A candidata do PSTU, Vera Lúcia, também está com um discurso afinado contra a guerra às drogas. “Essa abordagem, de manter as drogas proibidas, serviu apenas para criar um tráfico poderosíssimo. As drogas precisam ser descriminalizadas e vendidas de forma legal, com imposto cobrado sobre sua comercialização. No caso dos viciados, isso tem que ser uma questão de saúde pública, jamais de polícia. A criminalização das drogas mata usuários, policiais e moradores de comunidades,” declarou Vera durante uma atividade de panfletagem no Rio de Janeiro.
Causa surpresa a posição de Meirelles quando lembramos que ele fez parte de governos (do PT e do MDB) que nada fizeram para superar a proibição.
Meirelles fica, entretanto, em sintonia com sua formação liberal ao defender a legalização por se tratar de “uma questão de direito individual”. Importante registrar que esta posição do candidato diz respeito apenas a maconha. Para as demais drogas, ele defende a manutenção da lei vigente.
Chama atenção a posição de defensores do liberalismo que lançaram o contraditório slogan “liberal na economia e conservador nos costumes”.
Está é a posição do candidato João Amôedo (Novo) e de Flávio Rocha, que seria candidato pelo PRB, mas desistiu da disputa. Para estes, o Estado precisa tirar as mãos da conta bancária do cidadão e do caixa das empresas, mas deve continuar usando os poderes de polícia para impor ao povo um controle de ordem moral.
Na prática, esta posição busca agradar o eleitorado conservador e religioso que faz coro contra as propostas como a legalização das drogas, do casamento LGBT e do aborto.
Mesmo entre os presidenciáveis favoráveis à legalização da maconha, o espaço o destinado a este tema é mínimo. Boulos e Vera Lúcia contam com poucos segundos na televisão e devem priorizar outras pautas.
Meirelles terá mais tempo, mas falar de maconha não deve fazer parte da estratégia dos caciques e marqueteiros do MDB, que devem buscar estratégias mais caretas para tirar o ex-ministro da fazenda das últimas posições nas pesquisas de intenção de voto.
Além da improvável vitória de um candidato que defenda a legalização, a maconha não terá muitos aliados no Congresso Nacional. As poderosas bancadas do agronegócio e religiosa estarão unidas contra qualquer proposta para retirar a cannabis da ilegalidade.
Nesta conjuntura, a maconha deve continuar na ilegalidade ao menos até 2022, quando teremos outra eleição. Enquanto isso, a guerra para prender alguns poucos quilos da erva vai continuar a produzir mortes e um grande número de prisões de pequenos varejistas do tráfico. Nada disso afetará as finanças do narcotráfico, que vai continuar operando normalmente.
A única luz no fim deste túnel sombrio está na possibilidade de regulamentação, pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, do uso medicinal da maconha.
A indústria farmacêutica importa cannabis para produzir os medicamentos dentro do Brasil, mas a maior vitória será o direito de qualquer família ter um jardim canábico em casa para produzir o seu próprio medicamento.
A luta por dias de paz e segurança para quem quer vender ou comprar cannabis no Brasil ainda é um sonho distante. Até lá, ainda vamos encontrar muita maconha no noticiário policial, acompanhada de registros fatalidades e encarceramento que poderiam ser evitadas com uma simples mudança na lei.
FONTE: Hempadão

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