São Paulo – O professor Elisaldo Carlini, 88 anos, da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), estuda há 62 anos o efeito das drogas no corpo humano e seu uso médico. Na quarta-feira, o psicofarmacologista foi intimado a prestar depoimento à polícia de São Paulo, no 16º DP da zona sul, por “apologia ao crime”, junto com um grupo de pesquisadores da Unifesp.
O Ministério Público decidiu abrir a investigação após a realização do 5º Simpósio Internacional Maconha Outros Saberes, que ocorreu em maio do ano passado.
Os organizadores do evento convidaram Geraldo Antonio Baptista para palestrar em uma das mesas. Conhecido como Rás Geraldinho, ele está preso desde 2013, condenado por tráfico de drogas. Geraldinho é fundador de uma igreja de denominação rastafari em Americana, no interior paulista. A filosofia religiosa utiliza a maconha como parte de seus rituais.
Os pesquisadores pediram autorização judicial para que Geraldo pudesse comparecer ao simpósio. A Justiça, no entanto, negou o pedido e o evento aconteceu sem a participação do religioso. Ele deveria falar sobre o uso ritualístico da substância.
Pioneiro na sua linha de pesquisa no Brasil, Elisaldo Carlini já recebeu duas condecorações entregues no Palácio do Planalto pelo então presidente Fernando Henrique Cardoso.
Universidade defende pesquisador
Na sexta-feira(23) a Unifesp divulgou nota em defesa do professor Elisaldo Carlini. No comunicado, a instituição destaca o extenso currículo do docente, que já foi presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e membro do Conselho Econômico Social das Nações Unidas. Além disso, o texto enfatiza que Carlini foi citado “12 mil vezes em pesquisas científicas nacionais e internacionais” relacionadas ao uso da maconha.
A universidade considerou a intimação do pesquisador como um ataque ao seu trabalho. “Carlini vem sendo criminalizado em função de sua pesquisa sobre drogas medicinais à base de Cannabis sativa, pela qual é internacionalmente reconhecido”, enfatiza a nota.
Outro pesquisador da Unifesp, Renato Filev, que também participou da organização do simpósio, se defendeu e disse que os responsáveis pelo evento agiram de boa fé. “A gente achou que não estava cometendo nenhum tipo de crime, se a gente está pedindo autorização judicial, para o juiz”, ressaltou.
Para Filev, o inquérito acabará sendo arquivado, uma vez que Geraldo sequer chegou a ir ao evento. Para ele, a situação é parte das distorções criadas pela atual legislação de drogas.
“A lei, por mais que tenha vindo em uma tentativa de melhorar a lei anterior, ela de fato piorou. A gente tem um super encarceramento após ela: duas em cada três mulheres estão presas por tráfico. Aumentou em mais de 500% as prisões por tráfico no país. Essa lei de drogas está sendo muito maléfica e pouco discutida”, criticou o pesquisador ao se referir sobre a legislação que entrou em vigor em 2006.
FONTE: EXAME